quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Artigo: Contestando Renato Teixeira - A/01119


Contestando Renato Teixeira

No dia 06 de abril de 2009, um semanário de Aracaju publicou uma entrevista com o titulo de “A música brasileira é muito poderosa”, que tinha como entrevistado um dos expoentes da atual música popular brasileira, o competente e considerado Renato Teixeira.

Ao ser inquirido sobre o que aconteceu com as duplas então chamadas de caipira, o grande artista cometeu uma injustiça monstruosa para com o sagrado e eterno valor daqueles que em seus duetos refinados saíram da roça para encantar o mundo. Renato afirmou convicto de que o ciclo da música caipira havia se encerrado.


Permita-me, meu caro leitor, fazer um breve histórico sobre aquela que se convencionou em chamá-la de música caipira. O violeiro e a viola viviam escondidos nas fazendas e tulhas de café. Um dia, lá nos idos de 1929, um apaixonado e ardente defensor do canto sertanejo, filho da cidade de Tietê, em São Paulo, chamado Cornélio Pires, teve a ousadia de transportar para a cidade grande e gravá-las em discos três músicas caipiras. Eram elas as modas “Bonde camarão”, “Moda do peão” e “Jorginho do sertão”. E assim o gênero musical do homem do campo que tinha como sublimação o som mágico de uma viola e a primeira e segunda voz de notáveis cantadores inebriou os povos citadinos.

A afirmativa destemperada de Renato Teixeira carece de fundamentos. Parece até que ele carrega, como tantos outros, o ranço da discriminação e do preconceito perante a grandeza imensurável da verdadeira música sertaneja, aquela que tem na “moreninha das dez cordas” a sua eterna companheira.
Ora, como é que Renato Teixeira tem a imprudência de dizer numa entrevista que o ciclo da música caipira acabou? Música caipira ou sertaneja é eterna, jamais terá fim. Se o entrevistador lhe perguntasse pelas imortais “Índia” e “Meu primeiro amor”, duas guarânias paraguaias adaptadas por Zé Fortuna, que era considerado o “Sábio da música sertaneja”, o que Renato iria responder? Talvez o entrevistado não saiba que estas duas majestosas canções foram gravadas por Cascatinha e Inhana, no distante ano de 1955, na Todamérica. O mesmo acontecendo com a fabulosa canção “Beijinho doce”, outro inesquecível clássico dos “Sabiás do sertão”, Cascatinha e Inhana. E para tristeza e decepção dos que torcem contra a música caipira, que é a mesma música sertaneja, ela continua viva e fazendo sucesso até em novelas da Rede Globo de Televisão e outros sistemas de telecomunicações.

Se lhe fosse perguntado pela beleza incomum do ritmo de um cururu – será que Renato Teixeira sabe o que significa um cururu na música sertaneja? – Não. Acho que não. Pois a célebre música “O menino da porteira” é um cururu. Esta mágica canção foi gravada também em 1955, pela dupla, Luizinho e Limeira e se tornou filme. Sérgio Reis e o cantor Daniel que o diga. E a inigualável “Tristeza do Jeca”, o carro-chefe da música sertaneja, uma composição do notável Angelino de Oliveira, gravada pela Continental, em 1947, nas vozes divinas de Tonico e Tinoco. Ainda Chico Mineiro, o monumental clássico de Tonico e Tinoco que todo Brasil reverencia. Estas e muitas outras canções ultrapassaram o tempo e o passar dos anos não irão jogá-las no abandono e nem no esquecimento sob hipótese alguma.

Mais do que ninguém, Renato Teixeira sabe que o gênero musical violeiro jamais morrerá. A verdade é que os empresários, os diretores de gravadoras, a mídia, os novos e inconsequentes compositores, fazem de tudo, aí sim, para assassinar a verdadeira música sertaneja, aquela que eterniza a historia do povo; aquela que tem mensagem, amor, ternura e decência. Por que tamanha injustiça? Para colocar em seu lugar esta água com açúcar de péssimo gosto, desenxabida e sem graça, cercada por instrumentos eletrônicos, numa afronta e num acinte a grandeza da viola? É assim que indecentemente chama de música sertaneja moderna um gênero que além da primeira e segunda voz não se vislumbra mais nada que identifique uma música sertaneja. Neste disparate musical não existe a magia da viola, nem a melodia de um cateretê, de um cururu, de uma moda de viola, de uma toada, de um rasqueado, de uma valsa, valsinha e valseado. Enfim de tudo aquilo que é a essência da música sertaneja. O que essa gente quer é nos roubar este nosso tesouro musical e intitular as duplas que numa perversa e criminosa farsa se diz sertaneja quando, na verdade, esses farsantes só sabem cantar baladas, melodias românticas, ou músicas dançantes, sem inteligência, sem beleza e sem acordes.

Será que tudo isto não passa de inveja e dor de cotovelo para com duetos imortais tais como Tonico e Tinoco, a maior de todas as duplas; Zico e Zeca, Tião Carreiro e Pardinho, Cascatinha e Inhana, Luizinho e Limeira, Sulino e Marrueiro, Lourenço e Lourival, Jacó e Jacozinho, Belmonte e Amaraí, Tibaji e Miltinho, Duo Glacial, Pedro Bento e Zé da Estrada, Abel e Caim, Dino Franco e Mouraí; e tantas outras duplas que deixaram para a posteridade páginas musicais gloriosas que nem o tempo e nem a maldade dos que nos dias atuais fazem de tudo para assassinar a nossa verdadeira música violeira irão conseguir. Esses malvados não irão obter êxitos em seus criminosos intentos.

Coitados daqueles que imaginam que a música caipira encerrou o seu ciclo. A música caipira é imortal, é eterna. O resto é resto. Não acrescenta nada.

Publicado nos dias 12 e 13 de abril, de 2009,
no JORNAL DA CIDADE, Aracaju – Sergipe.

(Alcino Alves Costa, o Caipira de Poço Redondo. Notável homem de letras, ele descreve com aptidão as belezas de sua terra. Num estilo muito próprio, esse sergipano de alma sensível e grande conhecedor dos costumes de sua gente, declara todo o amor que possui pelo sertão nordestino, muito bem representado nas palavras sinceras, in “O Sertão de Minha Terra” e “O Sertão e a Caatinga”, artigos que assina com maestria .  Pelo que faz e representa,  merece o respeito do povo de sua Terra, de sua região, e de todos nós brasileiros).

Alcino Alves Costa
O Caipira de Poço Redondo - Sergipe

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