de MS, Higa quer reunir fotos
em livro, mas falta apoio
registrando a história e os personagens
dela em Mato Grosso do Sul
Não há um aniversário de Mato Grosso do Sul ou, em outro extremo, um episódio de morte de personalidade, em que Higa não é procurado para fornecer seu testemunho fotográfico. Apesar disso, ele nunca conseguiu reunir os arquivos em uma publicação, desejo revelado ao Lado B. “Há 13 anos que estou tentando um patrocinador”, conta.
Higa tem foto de tudo, do surgimento de instituições importantes, como a Universidade Federal; de tragédias naturais, como a enchente que transformou Porto Murtinho em cidade de lona; do tempo de estádios cheios no futebol e rivalidade entre Comercial e Operário; da cerimônia de criação do Estado; da primeira assembleia constituinte. Fez também, os primeiros registros da atuação do movimento sem-terra no Estado, no que viria a se transformar no município de Itaquiraí. Registrou, ainda, muitas festas da “sociedade campo-grandense”.
“Em 1977 fotografei a festa feita pelos campo-grandesses pelas ruas das cidades com passeatas, carreatas e em 1979 fotografei a implantação do estado de Mato Grosso do Sul que teve como primeiro governador o gaúcho Harry Amorim Costa, diretor do DNOS (Departamento Nacional de Obras e Saneamento), em função de brigas dos “caciques políticos” locais”, relembra.
Alernativa virtual- Em 2010, o fotógrafo aderiu às mídias sociais e criou uma espécie de museu virtual no Facebook, bastante visitado e comentado. Nostalgia é o sentimento que parece pular das fotos, ao resgatar um tempo de Mato Grosso do Sul de crescimento vertiginoso, de uma Campo Grande ainda prosaica, bem diferente da cidade que, cada vez mais, perde o ar de inocência de antigamente.
A disponibilização das fotos na internet, revela Higa, é para preservar a memória, mas é também alternativa ao projeto da publicação ainda sem dinheiro. “É um maneira de fazer com que a sociedade sul-mato- grossense não se esqueça de pessoas e de fatos que muito marcaram o início deste nosso estado tanto na política como no esporte e sociedade”, define.
De oficce boy à testemunha da história- Higa está prestes a completar 61 anos de idade, 43 anos deles dedicados à fotografia. Nascido em Campo Grande, “no Mato Grosso”, começou a trabalhar no Diário da Serra, jornal extinto na década de 1990, que chegou a integrar o grupo nacional Diários Associados.
Como muitos profissionais da imagem, não foi sua primeira ocupação. Era office boy do jornal. “Me foi dada a oportunidade de tornar fotógrafo em Campo Grande, desde que eu tomasse conta dos filhos do fotógrafo titular do jornal”. O profissional citado é Danton Garro que, já tendo trabalhado em diversos órgãos de imprensa do Brasil, inclusive cobrindo 4 Copas do Mundo, veio para tratamento de saúde em Campo Grande.
Antes das ruas, a experiência do quartinho escuro onde as fotos em papel eram reveladas. “Fui laboratorista durante alguns anos, pois o fotógrafo Danton Garro dizia que o bom profissional de imagens tem como obrigação aprender primeiramente a conhecer química”.
Depois que a fotografia virou profissão, Higa nunca mais parou e não conheceu outro trabalho. Por isso mesmo, fala dele com paixão, percebida mesmo em causos policiais caídos no esquecimento. “Presenciei vários fatos, do nascimento do meu filho ao assassinato bárbaro do Demetrio Amin, que foi torturado e assassinado por bandidos vindo de São Paulo só com essa finalidade. Comentava-se na época que seu Demetrio guardava muito dinheiro e ouro, escondidos em sua casa em uma vila residencial na rua Dom Aquino, entre a 14 de julho e a Calógeras. Esse senhor foi barbaramente torturado, tendo os seus dedos amassados por martelos, os dentes arrancados por alicates e as palmas das mãos perfuradas com pregos. Foi morto com um produndo corte em sua jugular feito com uma faca de cozinha. Apesar de ser torturado dessa forma não revelou onde escondia sua fortuna. A polícia, durante a investigação encontrou todo o seu “dinheiro” em latas de bolachas, gordura e também dentro do colchão”, rememora.
Meio ambiente- Há um projeto particular acentuado por Higa na entrevista, as fotos da natureza pantaneira e o acompanhamento, através da ida a campo, do resultado da intervenção humana na região e da ocupação pela pecuária de corte.
“Desde o inicio dos anos 70 fotografo o Pantanal. A transformação que esta localidade sofreu nesses últimos anos muito me entristece e me preocupa", pontua. "Nas cheias do Pantanal no final dos anos 70 e inícios dos anos 80 na estrada entre Miranda e Corumbá, possuo imagens de barcaças transportando gado para parte mais alta da região. Hoje em dia nestas mesmas localidades não existe mais nada a não ser pasto. Até os corixos que possuíam milhares de jacarés nativos desapareceram do cenário. No ano de 2003, passeando por esta mesma estrada, entre Miranda e Corumbá fotografei um ninho de graveteiro com vários sacos plásticos jogados pelos turistas”, lamenta.
Hoje, Higa é funcionário da Assembleia Legislativa e fixou seu trabalho em Campo Grande, onde mantém um escritório voltado à iniciativa privada. Também virou professor informal de quem quer saber mais sobre fotografia e o procura. "Recebo frequentemente universitários no meu escritório e também dou palestras em instituições".
Indagado sobre a invasão dos celulares que fazem fotos e das câmeras digitais, que transformam qualquer um em fotografo, ele usa o bom humor, ao descrever uma entrega de diploma a profissionais liberais. “A concorrência” com os “fotógrafos” era tanta que você disputava o mesmo espaço com pessoas de 80 anos, que estavam fotografando os netos e bisnetos e com crianças de 8 anos, fotografando os pais, irmãos etc”.
Do alto de quem sabe que o olhar do talento muda tudo, ele define. "Sempre vai haver o afunilamento e vão sobrar os diferenciados".
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