quarta-feira, 5 de maio de 2010

Artigo: O livro do PUCCI - A/0816 - (Parte XXXVII

PONTOS A PONDERAR

Com esse titulo, a revista Seleções de Reader’s Digest por muitos anos publicou uma seção extremamente interessante. É o que faremos aqui: ponderar alguns pontos.
Hoje está em voga a corrente zen, que trouxe um milhar de métodos de meditação, cuja importância para o homem moderno é indiscutível. Tão importante quanto interromper o fluxo de pensamento e mergulhar em mandalas, contudo, especialmente para o homem cada vez mais alienado do século XX, é mergulhar também na realidade e ponderar suas inúmeras variáveis, a fim de equacionar um pouco melhor as contradições de um século que para muitos parece quase perdido.
O engenheiro mecânico e rabino da Congregação Judaica do Brasil Nilton Bonder, 40 anos, doutor em literatura hebraica pelo Jewish Theological Seminary, autor de livros inspirados, com aguçado senso de oportunidade escreveu artigo na folha de São Paulo de 17 de dezembro último que coloca um desses importantes pontos a ponderar.
Começa por dizer que “o meio século de publicação da Declaração Universal dos Direitos Humanos representa mais um capítulo do século 20, um sonho do Ocidente que contabiliza mais de 3.000 anos. Refiro-me ao período iniciado com os Dez Mandamentos, que instaurou a visão de que os seres humanos poderiam alcançar um estágio de respeito profundo entre si, modificando radicalmente suas relações. Essa primeira carta do ocidente, que chegaria ao mundo cristão por Jesus e ao mundo muçulmano por Maomé, encontrou sua expressão laica e moderna na declaração”.
Discutindo a questão de como nossas convicções a respeito da natureza humana e de seu aprimoramento são arcaicas e muitas vezes míticas, ele acrescenta: “o conceito de direito é por demais controlador, masculino e distanciado do mundo natural. O ser humano não transformará este mundo pela noção de direito, mas sim por aquilo que o mobiliza - os interesses. O reconhecimento de que o ser humano não conseguirá exorcizar o mal de dentro de si e abraçar o bem, agir e reagir pela ordem dos direitos, é um importante passo para construir um mundo de menos hipocrisia e verdadeira cooperação. É essa a grande crise das ideologias que experimentamos”.
Nesta parte de sua reflexão queremos crer que o autor toca numa questão de importância capital para a compreensão do comportamento humano atual e, conseqüentemente, para uma ação pedagógica na sociedade moderna.
Realmente, o que vemos são, por um lado, belos discursos e maravilhosas intenções serem espalhadas por todos os meios sem que produzam um único fruto de melhoria da realidade humana em qualquer de seus aspectos; por outro, que a mola propulsora de todas as ações, a começar pelas nossas, é o interesse.
Aqui se encontra, portanto, o foco real de nossa reflexão: são interesses e não boas intenções que movem o mundo. Esse mito das boas intenções é um dos mitos que nos dirigem sem que o percebamos - tem nos feito dizer, por exemplo, sempre que queremos demonstrar nossas “boas intenções”, que nossas ações são desinteressadas. Puro mito!
Continua o artigo: “Há um antigo conto hassídico em que rabinos conseguem aprisionar o 'mau impulso' e ficam eufóricos por poder tirar a sombra e a fonte do mal de circulação. Tudo para descobrir que os trabalhadores paravam de trabalhar, uma vez que se viam destituídos de ambição, ou que os homens e mulheres deixavam de se procurar uns aos outros, por terem perdido o desejo. As sombras, desde que dentro de seus limites e contornos, têm também sua função”.
Essa relação dialética, dual, da natureza das cosias, o maçom conhece. Sua reflexão sobre a natureza do número 2 já o convenceu de que as coisas são duais e contraditórias: o claro e o escuro, o quente e frio, o bem e o mal, são polarizações de uma mesma realidade. Mas, condicionados pelos mitos correntes em nossa cultura, também nós temos tido dificuldade de ver esse ponto que o rabino Bonder nos indica com bastante felicidade.
Geralmente o óbvio é mais difícil de se ver!
Contudo, devemos também ponderar que há interesses legítimos e ilegítimos, construtivos e destrutivos.
“O segredo mais fácil de apontar do que de realizar, é fazer os direitos coincidirem com nossos interesses (...) Como transferir a fonte que clama por justiça da pessoa da vítima para a do perpetrador? (...) Alguns falam de uma relação com a vida que seja como a do jazz. Cada pessoa é independente e busca a excelência com seu solo, mas deve estar constantemente em harmonia com o conjunto. Cada um toca seu instrumento, mas só há arte se sua participação compõe, com o grupo, uma musica bela”.
Como fazer com que tenhamos realmente interesse no bem comum, no equilíbrio ecológico, na tolerância e na justiça social? Esse é um grande desafio. As grandes transformações colocam grandes desafios. Não é do papel do maçom aceitar tais desafios; ao contrário, é o papel do maçom enfrentar tais desafios. O que buscávamos nós ao pedirmos ingresso na Sublime Instituição? A satisfação de nossos interesses pessoais, alguns deles conscientes e outros inconscientes.
Na maçonaria aprendemos, contudo, que para satisfazer nossos interesses é fundamental que realizemos a transformação do mundo, para que tenhamos um mundo que atenda a nossos interesses. Essa a tarefa: realizar a grande coincidência de interesses.
Com certeza não sabemos bem - e talvez jamais o saibamos - de que forma os interesses se realizam ou se modificam; também não sabemos que mudanças nossas intenções de mudança de fato produzirão; sabemos apenas, e isso já é bastante, que nosso papel é ativo e não passivo. Devemos agir e não apenas contemplar. O futuro... bem, o futuro será com certeza a Grande resultante das infinitas ações interessadas dos homens.

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