A população de um modo geral se amontoa em cortiços em
adiantado estado de desintegração, herança mal cuidada de uma época em que a
cidade convivia com um progresso e um desenvolvimento de há muito esquecido
pelos seus habitantes.
A ilha-cárcere dos irmãos Castro, com seus
onze milhões de almas mantidas na mais rasa pobreza e miséria pelo regime
socialista – com exceção de restrita minoria da burguesia capitalista estatal
do politiburo do partido único – sofre de um déficit habitacional de meio
milhão de moradias, mesmo dentro da indignidade dos padrões residenciais do
país. Tal situação, no entanto, piora a cada ano pela ação corrosiva da
umidade, da salinidade marinha e dos ciclones tropicais que se abatem
rotineiramente sobre a região. A agência de notícias ‘The Associated
Press’ publicou recentemente uma matéria que mostra o fenômeno
relatado pelo título deste pequeno artigo, da qual seleciono duas fotos emblemáticas
incluídas em seu texto.De repente, em Havana, um grande estrondo, como um trem passado perto ou mesmo como uma explosão, acorda de sobressalto a vizinhança da área de Oquendo 308, no populoso bairro do Centro da cidade. Uma parte do sétimo andar de um velho edifício desmoronou para dentro do pátio interno, danificando os apartamentos de baixo. Por sorte, ninguém morreu, mas cerca de 120 famílias que moravam no prédio ficaram ao relento sem local para habitar.
Anaidis Ramirez, um dos lesados no desmoronamento, morava
com nove parentes num apartamento de um quarto em Havana com teto muito alto
onde fizeram um mezanino sem qualquer controle de engenharia. Apesar dos terremotos serem ocorrências extremamente raras em Cuba, tais
desmoronamentos costumam acontecer com frequência em especial em Havana, a
capital do país.
É claro que isso não ocorre nas protegidíssimas áreas onde se situam as
residências da pequena alta burguesia que governa a ilha com mão de ferro. Os
desmoronamentos acontecem onde, por décadas, a falta de manutenção dos prédios
e a escassez socialista da construção civil estatal consistem nos principais
problemas sociais da ilha, sem que até agora seus governantes se disponham a
realizar as reformas prometidas pelo populismo demagógico do novo ‘ditador da
vez’ da dinastia dos Castros, o novo ‘comandante’ Raúl Castro.
De catástrofe em catástrofe, os sujos refugiados se amontoam em bivaques
em parques públicos da cidade como uma forma de pressionar o governo a lhes
providenciar novas moradias. Enquanto isso, outras famílias passam a morar
com parentes ou aceitam ser levadas para ‘albergues provisórios do governo’,
onde vivem amontoadas já há anos numa espera infrutífera por uma casa própria
doada pelo regime.
No fim de 2011, Castro “legalizou o mercado” de bens duráveis na ilha –
pela primeira vez em cinco décadas – sob argumentos dentre os quais se destacou
o de que a nova legislação estimularia a construção civil de novas moradias e
as reformas das antigas. Os resultados, até hoje, no entanto são pífios e “o
déficit habitacional poderia ser ainda maior caso a avaliação fosse baseada na própria
definição do governo daquilo que constitui uma ‘moradia adequada’ (tantos
metros quadrados, com banheiro e cozinha interna, e etc.)”, nas palavras do
pesquisador Sergio Díaz-Briquets, doutor em demografia da Universidade da Pensilvânia,
nos EUA. De acordo com ele, as estimativas da carência habitacional em toda a
ilha estariam entre 800.000 a um milhão de moradias. Segundo o Escritório
Nacional de Estatística e Informação (ENEI), a ilha dispõe de um total de 3,8
milhões de “unidades de alojamento” (residências ou apartamentos). Com um pacote de reformas que incluiu a mencionada modificação da lei
que regula a compra e a venda de bens duráveis, as autoridades do regime
insular começaram a por em ação um plano de subsídios às famílias para ampliar,
reformar ou terminar suas casas.
O Vice Primeiro Ministro da Construção Civil,
Angel Vilaragut, explicou que “a medida visou buscar soluções para o enorme
problema do déficit habitacional que flagela Cuba hoje em dia”. Ele considera
que não há um “estancamento” dessas novas medidas e dos subsídios, mas apenas
uma “mudança de política”. “Não se pode suspender a construção de moradias por
meio do estado”, disse Vilaragut, mas “o que se quer é que a população tenha
acesso aos materiais de construção”, como areia, cimento e tijolos para que possa
edificar. Todavia, como ninguém ganha dinheiro com o processo – como é parte da
ilusão comunista – o desinteresse é geral por parte da própria população
afetada, praticamente destituída de qualquer perspectiva de melhoria
social.
Paralelamente, o governo de Havana decidiu
também entregar à população antigos prédios comerciais, armazéns e outras
edificações estatais subutilizadas para serem adaptadas como moradias. Um
simples passeio pelas ruas de Havana mostra como as pessoas estão a “tirar
proveito” do momento para consertar as fachadas, e incluir um segundo andar a
essas construções – nem sempre com a supervisão adequada de engenheiros
qualificados – para agregar mais moradias, numa verdadeira “cultura do
puxadinho”. O resultado é o aumento de cortiços que crescem desordenada e
caoticamente em plena capital do país.
Os próprios analistas cubanos dizem, com os
cuidados que isso requer por lá, que “as soluções adotadas pelo governo às
vezes beneficiam uma ou outra família, mas que os esforços são pouco
sistematizados e não conseguem reduzir o déficit habitacional em seu conjunto”. Os trabalhos possibilitados por essa
política dirigida pelo estado socialista começaram fortes em 2008, quando a
ENEI relatou a construção e reforma de 44.775 residências, mas, depois disso, a
queda dos números se tornou uma tendência crescente por parte tanto do estado
como de iniciativas particulares. Em 2011 apenas 32.540 casas e, em 2012,
32.103 novas casas foram terminadas. Quanto a 2013 ainda não existem estatísticas
disponíveis, mas os números preliminares são inferiores ao esperado.
Após um balanço do setor de dezembro último
na Assembleia Nacional, o ‘parlamento’ unicameral de partido único – uma
caricatura de mau gosto de democracia – o deputado Santiago Lage revelou que no
fim de outubro de 2013, o setor estatal veria ter terminado 10.450 casas
populares, mas apenas 80 por cento da meta foi atingida, ao passo que o esforço
privado de uma população extremamente empobrecida conseguiu terminar 9.604
novas moradias, o que demonstra a fragilidade da política governamental para o
setor. Com tal projeção, 2013 deverá se inclusive muito pior que o ano
anterior.
O economista cubano Pavel Vidal, atualmente
professor da Universidade Xavieriana da Colômbia argumenta que “pode ser que
essa mudança no ‘mecanismo estatal’ leve algum tempo ou que o novo sistema não
esteja compensando. Caso a responsabilidade da construção civil de casas
populares esteja sendo atribuída aos “contapropristas” (a nova categoria de
pessoas autorizadas a trabalhar por conta própria), às microempresas e as recém
criadas cooperativas, esse novo setor privado, na escala que tem, com o capital
do qual não dispõe, evidentemente não irá compensar o que o estado cubano vem
fazendo, por mais insuficiente que seja”. E isso sem contar com as dificuldades
que os cubanos têm para comprar uma casa popular já pronta, conforme a nova
lei.
Distante umas poucas quadras do edifício
parcialmente desmoronado, mora Lázaro Márquez, de 44 anos, que compartilha com
sua esposa Mileivis e sua filha adolescente e incapaz apena um quarto numa
“cabeça de porco” (um cortiço) no Centro de Havana, descreve que o lugar tem
infiltrações de água de esgoto e rachaduras pelas paredes. O local é lúgubre e
fétido. Márquez ganha em média 50 pesos (2 dólares) por dia dirigindo um
“bicitaxi”, e há seis anos seu nome está numa lista – que parece não avançar
nunca – de casos que requerem apoio urgente do estado para que possa sair dali
e ir para uma casa popular melhor, uma vez que sua filha na fala nem anda e tem
que ser carregada numa cadeira de rodas pelas intrincadas escadarias com grande
perigo de cair.
Caso não consigam solucionar por si próprios
onde morar, ou seja, construir ou comprar, os três acabarão tendo que ir para
algum albergue estatal, isso se antes o prédio em que vivem não desabar sobre
suas cabeças. Mas, um apartamento de um quarto pequeno no Centro de Havana
custa cerca de sete mil dólares... “Na verdade, não existe um mercado de bens
duráveis liberalizado, mas apenas uma flexibilização da compra e da venda de
casas, todavia com muitas restrições”, explicou Vidal. Ou seja, o regime cubano não pratica nem um
capitalismo estatal direcionado a beneficiar o povo nem tampouco permite que o
capitalismo privado se desenvolva para criar prosperidade e riqueza para as
pessoas. No mundo inteiro a procura pela casa própria suscita um mecanismo
financeiro, tanto privado como estatal, que gera um crédito hipotecário que –
em condições normais e sem abusos populistas – estimula a expansão da indústria
da construção civil de novas unidades habitacionais, que beneficia todas as
camadas da população, principalmente as menos “favorecidas”. Qualquer
economista sabe disso.
Mas em Cuba, um feudo político dos Castro, a
coisa não é vista como no resto do mundo e para o regime, a maior ameaça é o
aumento da prosperidade e da riqueza que as pessoas do povo possam conseguir
com seu trabalho diário. Enquanto isso não muda, os prédios em Havana
continuarão desmoronando, até que um dia desmorone de vez o malfadado regime
socialista que vitimiza a população da maior ilha caribenha.
(FRANCISCO VIANNA - Médico, comentador político e
jornalista - Jacarei, Brasil)
Nenhum comentário:
Postar um comentário