NOTAS SOBRE ASTROLOGIA E MAÇONARIA
No interior dos templos maçônicos, notamos doze colunas, dispostas seis ao norte e seis ao sul, representando os doze signos zodiacais, Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão, do lado norte; Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes, no lado sul.
Essas colunas, diz-nos Haendchen[1], não devem ser confundidas com as colunas B e J, quer são de Ordem Coríntia e situam-se à entrada do templo, e nem com as colunetas do Venerável Mestre, 1º e 2º vigilantes, respectivamente de Ordens Compósito, Dórico e Coríntia.
Zodíaco é a faixa da esfera celeste pela qual se movem o Sol, a Lua e os planetas. A linha central do zodíaco é a eclíptica, trajetória aparente do Sol em torno da terra. A faixa compreendida sobre ela, de 360º, é dividida em 12 partes, e cada uma corresponde a uma constelação.
Como a eclíptica é inclinada em relação ao equador celeste, o ângulo dessa inclinação varia com o tempo, o que é chamado de obliqüidade da eclíptica. Dessa forma, há 22 séculos atrás, quando Hiparco descobriu esse fenômeno, denominado precessão dos equinócios, o Sol, ao cruzar em março o equador celeste, encontrava-se no signo de Áries, que passou a ser o signo representativo desse mês. O movimento de precessão dos equinócios, contudo, deslocou os pontos de cruzamento do equador celeste para Peixes, não havendo mais, hoje em dia, correspondência entre o zodíaco real e o representado nos “horóscopos”[2].
Alguns astrólogos defendem que atualmente se deva fazer a “correção” dos signos, enquanto que outros são pela manutenção do zodíaco tradicional, alegando ser ele mais simbólico que real. Tais posições derivam do enfoque que se adote.
A astrologia tradicional, nos ensina Teixeira de Freitas[3], foi desenvolvida, principalmente, a partir do trabalho do astrólogo francês Jean Baptiste Motina de Villefranche (1583-1656), que serviu ao cardeal de Richelieu e à corte francesa de sua época. Posteriormente, duzentos anos mais tarde, uma nova vertente do pensamento astrológico se desenvolveu a partir da Teosofia, movimento político e espiritualista iniciado em fins do século passado por Helena Petrovna Blavatski, influenciando significativamente o trabalho atual da astrologia através de nomes como Annie Besant e Alice Bailey.
Tanto a posição de Villefranche quanto a visão teosófica, baseada no carma, são fortemente deterministas, deixando ao homem pouca possibilidade de interferir com seu “destino”, já que este ou é obra dos deuses ou é resultado dos pecados de vidas passadas.
Com o trabalho do pintor, músico, escritor e astrólogo norte-americano Dane Rhudyar, a astrologia do século XX, a partir dos anos trintas, vem alternando esse enfoque determinista. Em lugar de uma astrologia “centrada nos ventos, Rhudyar propôs uma centrada na pessoa", que chamou de astrologia humanística. Entendendo que as ações das pessoas refletem necessidades profundamente arraigadas nelas, mesmo que inconscientes, propunha uma astrologia que visasse descobrir essas razões do agir humano, permitindo a possibilidade de escolhas mais conscientes.
Com essa perspectiva, do ponto de vista desse autor “destino” passou a ser visto como uma possibilidade predefinida dentro da própria pessoa, vindo a manifestar-se pela seleção, inconsciente, que essa pessoa faz dos eventos ou objetos no mundo fenomênico.
Dentro dessa visão, não há signos bons ou maus, mais fáceis ou mais difíceis. Cada signo é apenas o indicativo de um dos caminhos - estilos, poderíamos dizer - através dos quais a pessoa busca a sua totalidade, a sua individuação.
A astrologia passa assim a ser vista como simbolizando os impulsos inconscientes do comportamento emocional, representando-os nas várias constelações. Por isso, em seus primórdios, a astrologia só “aceitava” cinco planetas, depois sete e posteriormente dez, dependendo, assim da evolução do conhecimento humano.
Adotando essa perspectiva simbólica, para Teixeira de Freitas o Sol representa o centro da consciência humana, o Ego, representando o impulso de auto-realização, cujo objetivo é integrar harmoniosamente as várias partes do psiquismo. A Lua, simbolizando o lado feminino, representa a vivência emocional instintiva, com a qual a vivência consciente se combina para permitir a totalidade do psiquismo.
Os doze signos, portanto, são caminhos da vida psíquica e simbolizam, arquetipicamente[4], as possibilidades tanto do indivíduo quanto da coletividade.
O número doze se apresenta, também, sob outras formas: no número de apóstolos, de filhos de Jacó, de tribos de Israel, de trabalhos de Hércules. Também está representado na figura da abeta sobre o avental e da pirâmide sobre o cubo.
Tomados na sua totalidade, ainda segundo Teixeira de Freitas, os signos podem ser vistos como uma espiral evolutiva de três ciclos de quatro signos cada, representando o ciclo completo do amadurecimento humano: Áries, símbolo cardeal de fogo, positivo, iniciando o impulso da vida que surge do inconsciente indiferenciado no início da primavera no hemisfério norte (equinócio vernal); impulso que tem que ser contido e direcionado pela praticidade de Touro, para poder explorar o mundo exterior com a velocidade e superficialidade de Gêmeos até consolidar possessivamente, em Câncer, as informações assim obtidas. Com isso se cumpre o primeiro ciclo.
Em Leão, a intuição se acentua, marcando mais a autoconsciência, que produz em Virgem uma maior capacidade de discriminação e crítica, exigindo um equilíbrio, em Balança, que integre o outro em si mesmo, o que faz com que se inicie um recesso emocional profundo, em escorpião, preparando a morte do Ego no inverno que se prenunciava nesse outono. Cumpre-se o segundo ciclo.
Saindo de si em busca de princípios coletivos mais universais, em Sagitário, há maior inclinação à comunidade e à fraternidade. Mas o que foi adquirido é posto à prova, exigindo a perseverança e a paciência em Capricórnio. Todas as experiências do coletivo, intelectualmente analisadas em Aquário, devem finalmente se integrar aos traços da personalidade individual, o que exige profundo sentimento, em Peixes. E tudo recomeça em um nível superior. Podemos relacionar esses ciclos aos três graus da Maçonaria simbólica, visando o desenvolvimento da Intuição, da Análise e da Síntese, como ensina Castellani[5].
Por esse prisma podemos entender os quatro animais do Evangelho de Mateus: águia, boi, leão e homem, como sendo a representação das quatro funções básicas do processo de individuação: intuição (fogo); sensação (terra); pensamento (ar) e sentimento (água).
Temos a mesma representação no enigma clássico da Esfinge de Gisé que interpelou Édipo na peça de Sófocles. Como coloca muito bem Jorge Adoum[6] - embora com conotação mais mística que simbólica - quem domina esses “elementais” torna-se senhor de si mesmo.
Quem não o faz, será “devorado”.
[1] HAENDCHEN, Raul. As Doze Colunas. Revista O Prumo, nº 125, março/abril 99, p.19.
[2] ENCICLOPÉDIA BARSA
[3] TEIXEIRA DE FREITAS, Luiz C. O Simbolismo Astrológico e a Psique Humana. S. Paulo: Círculo do Livro, s/d.
[4] Arquétipos são disposições estruturais existentes nos estratos mais profundos do inconsciente humano e compartilhados pela espécie humana como um todo, embora se manifestando de forma individualizada.
[5] CASTELLANI, José. Fragmentos da Pedra Bruta. Londrina: Ed. A Trolha, 1999.
[6] ADOUM, Jorge. As chaves do Reino Interno. São Paulo: Ed. O Pensamento, 1995.
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