domingo, 26 de junho de 2011

Artigo: O Sertão e a Caatinga - A/0962

O Sertão e a Caatinga

O sertão sempre foi, desde as mais remotas eras, considerado o primo pobre das terras brasileiras. O parente indesejável que vivia – e ainda vive – numa indigência total e absoluta – assim propalam os arautos da descrença sertaneja.

Segundo o arrazoado desses doutores do saber e da verdade, a razão da extremada pobreza sertaneja está no berço de seu nascimento, uma região quase que sem umidade, estéril, praticamente improdutiva e despovoada do interior do país.

Foi naquele mundo de secura que nasceu o sertão. Suas terras adustas, imprestáveis, não têm serventia alguma; o seu chão, arroxeado em algumas partes e brancas em outras, é praticamente infecundo e de uma aridez irreversível – assim pensam os habitantes de outras regiões. Não é verdade.

É nesse mundo que se imagina de carência, pobreza, abandono e solidão que nasceu e vive por toda a encosta das eras, a caatinga. A caatinga é a filha predileta do sertão. É a sua mocinha amada. A rainha e deusa dos campos sertanejos.

Assim como o sertão, o viver da caatinga passa por períodos de transformações. No verão, sob os rigores do sol ardente, essa vegetação arbustiva perde a exuberância de suas folhagens; definha, murcha, tornando-se de uma sequidão de dar pena. Estiolados e enfraquecidos pelos terríveis e prolongados verões e pelas tenebrosas secas, estes dois tesouros da natureza – sertão e caatinga – vivem os piores e mais angustinates momentos de suas existências.

Contudo, se enganam aqueles que imaginam serem a caatinga e o sertão restos imprestáveis de garranchos e paus secos, jogados ao léu, sem valor nenhum. Puro e ledo engano. Basta que caia do céu a chuva, o bendito e abençoado sangue da terra, no dizer simplório e ao mesmo tempo sábio do caipira, para que aquela mataria que antes parecia morta, esturricada e sem vida, passe por uma transformação milagrosa ao ser impulsionada por uma sublime magia ou um milagre divino, que faz brotar de suas entranhas, da força poderosa de suas raízes, troncos e galhos, o verde generoso da fartura e da bonança. E, das planícies e vales, vicejam o verde e as leguminosas que também são bênçãos generosas de nossa mãe-natureza.

Com essa transformação, esse passe de mágica, ou esse milagre do Criador, a caatinga enverdece. O verde enfeita, embeleza, perfuma e alegra a natureza, formando um quadro lindo, um cenário sublime, onde a mão de Deus se faz presente.

Era essa a caatinga de outrora. Era naquele dantes sertão viçoso e maninho que a passarada gorjeava e fazia os seus ninhos nos galhos e ramagens de frondosas e seculares árvores. Era aquele sertão o mundo da onça pintada e da suçuarana, da jaguatirica e do gato do mato, do veado e do caititu, do gambá e do tamanduá, do preá e do mocó, do peba e do tatu. Vastas paragens sertanejas, abençoadas e virgens, onde o canário e o cabeço, o galo de campina e o xofreu, o xexéu e a pega, o papagaio, a arara e o periquito festejam o amanhecer divino dos dias sertanejos. Chão caboclo do canto mavioso do zabelê nos cerrados das caatingas. Rincão de nuvens claras, por onde andorinha, asa branca, garça branca da serra passeavam, voejando em bandos pelos descampados do infinito. Passagem divina, onde as árvores, frondosas e belas, amparavam, protegiam e guardavam os ninhos da casaca de couro. Mundo fantástico e misterioso da vida pastoril, da vacada pé-duro e do boi brabo e de ponta limpa. Matas densas e cerradas, paraíso do vaqueiro e do caçador. Caatinga de antigamente.

Hoje vivemos novos costumes e novos métodos de vida. O mundo embocou na modernidade dos tempos. O sertão e a caatinga agonizam nos últimos estertores de irreversíveis e brutais mortes. O que sobrou da flora e da fauna foram restos de um passado glorioso. Nos dias atuais a caatinga é triste, solitária, desnuda, pobre; aos poucos, assassinada pela mão perversa e maldita do homem.

Homem mau, que usa o machado e a moto-serra, para, sem piedade e sem amor, cortar e derrubar as nossas árvores, muitas delas nobres e seculares. Enegrecido homem que usa a sua espingarda assassina, para ceifar a vida de pássaros e animais silvestres.

Homem sem coração e sem piedade. Homem que não escuta o grito angustiado e dolorido dos valores da natureza, que clamam por vida. A caatinga pede socorro. A caatinga quer viver. Homens insensíveis dos novos tempos, saibam que a caatinga é o símbolo maior do homem do campo. A filha predileta do sertão e a netinha amada de nossa Mãe-Natureza. Deus salve a nossa caatinga!

(Alcino Alves Costa, o Caipira de Poço Redondo. Notável homem de letras, ele descreve com aptidão as belezas de sua terra. Num estilo muito próprio, esse sergipano de alma sensível e grande conhecedor dos costumes de sua gente, declara todo o amor que possui pelo sertão nordestino, muito bem representado nas palavras sinceras, in “O Sertão de Minha Terra” e “O Sertão e a Caatinga”, artigos que assina com muita galhardia. Ao poeta popular e intérprete da Literatura, que por três vezes foi mandatário de sua querida Poço Redondo, os sinceros cumprimentos da Coluna. Ele merece o respeito do povo de sua Terra, de sua região, e particularmente de nossos leitores. Parabéns, Alcino!)

Um comentário:

Anônimo disse...

Quem disse que o sertão é sinônimo de sofrimento e miséria? Quem disse que a vegetação cinza do sertão está morta? A quem interessa disseminar essas mentiras Brasil a fora? – Claro que é verdade que aqui não temos o que tem nas grandes cidades, os luxos e lixos urbanoides, e quem disse que o que tem nas grandes cidades é essencial á uma vida de valor, e quem foi o mala que também disse que o povo do sertão quer o que vocês ubanoides querem? Essas idéias afloram por conta da manipulação das mídias, pelos aproveitadores de plantão, e pelos conceitos de belas coisas, fabricadas na cabeça dessa galera escrota viciadas em televisão e Orkut. O povo do sertão meu amigo, estão muito bem adaptados com o ambiente, com o período que a água não cai do céu, e com a cinza paisagem da caatinga. Sobrevivemos de forma digna, somos cidadões no sentido real da palavra, sensíveis ao próximo e a este mundo cruel. Se vocês urbanoides acham que o sertão é sinônimo de sofrimento, observem as favelas perto de tua casa, os mendigos da tua rua, o teu vizinho drogado, o teu medo de ser assaltado, o psicopata da esquina, o ladrão na padaria, que talvez tu tenha noção de sofrimento e miséria. E para você que é muito sensibilizado com o sertão, que já fez até doação, saiba que seu dinheiro foi usado na ultima eleição...

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