sábado, 27 de março de 2010

Personalidade: Pierre-Joseph Proudhon - 0086

Pierre-Joseph Proudhon
(1809-1865)

Considerado por Bakunin "o mestre de todos os anarquistas", nasceu na França em 1809, no seio de uma família modesta.
Trabalhou como operário e tipógrafo. Como autodidata, desenvolveu suas próprias teorias sobre organização social, baseada na cooperação e no mutualismo. Em 1840 publicou o livro O Que é a Propriedade?, sob os auspícios da Academia de Besançon, onde se declara pela primeira vez anarquista. O livro foi elogiado por Marx, que o tentaria atrair mais tarde (1846) para um grupo de pensadores socialistas. No entanto, Proudhon na resposta a Marx questiona a criação de novos dogmas, o que levaria à ruptura com o socialista alemão.
Entre os anos 1844 e 1845, participou de vários encontros em Paris com Mikhail Bakunin e Karl Marx. Mas logo em 1846 Proudhon e Marx romperam por discordâncias fundamentais . Publicou sua obra Sistema das Contradições Econômicas ou Filosofia da Miséria que recebeu de uma crítica violentíssima de Marx em sua Obra, também clássica, Miséria da Filosofia.
Em 1847 Pierre-Joseph Proudhon foi iniciado em Besançon, na ARLS "Sincérité, Parfaite Union et Constance Réunies" do Grande Oriente da França. É retratado até hoje pelo GOF como "um maçom assíduo e cumpridor de seus deveres, além de haver influenciado fortemente no desenvolvimento da maçonaria na França".
Em 1848 Proudhon foi eleito deputado à Assembléia Nacional por Paris. Em julho desse ano, em discurso violento na Assembléia expôs a oposição entre proletários e burgueses, sendo objeto de advertência pelo Presidente do parlamento.
No ano seguinte Proudhon tentou organizar o Banco do Povo, que não conseguiu prosperar. Seus artigos no jornal Representant du Peuple e Le Peuple valeram-lhe vários processos judiciais que o obrigaram a se exilar na Bélgica.
De volta a França foi preso em 1849 tendo ficado na prisão até 1852, onde continuou escrevendo.
A edição do livro De la Justice dans la Révolution et dans L'Eglise, esgotado em poucos dias, provocou novo escândalo e um novo processo judicial, que o obrigou a exilar-se, novamente, em Bruxelas.
Regressou a França onde publicou novos livros entre os quais O Princípio Federativo e Da Capacidade Política das Classes Trabalhadoras que forneceu a base teórica do anarco-sindicalismo, defendendo que o "proletariado deve emancipar-se sozinho". Morreu em 1865, pouco depois da fundação da Primeira Internacional, criada em grande parte por iniciativa de operários mutualistas franceses.

Abaixo, reproduzo a carta que Proudhon dirigiu a Marx em maio de 1846 e foi o motivo para o rompimento de ambos, pois acentua nitidamente as diferenças de visão entre tipo de sociedade com a qual Proudhon sonhava e o projeto político de Karl Marx.


Para Karl Marx, 1846
Pierre-Joseph Proudhon
Lyon, 17 de maio de 1846

Meu caro Senhor Marx,
Concordei de bom grado em ser uma das pessoas incumbidas de receber suas cartas cujos objetivos e organização são, a meu ver, extremamente úteis. Porém não posso prometer respostas muito extensas ou freqüentes, já que minhas múltiplas atividades, combinadas a uma preguiça natural, pouco favorecem tais esforços epistolares. Devo também tomar a liberdade de fazer certas ressalvas que me foram sugeridas por várias passagens da sua carta.
Em primeiro lugar, embora minhas idéias quanto à organização e realização do movimento estejam no momento mais ou menos definidas, pelo menos no que diz respeito aos seus princípios básicos, creio ser meu dever - como é dever de todos os socialistas - manter ainda por algum tempo uma atitude crítica e dubitativa. Resumindo: eu em público professo um anti-dogmatismo quase absoluto.
Procuremos juntos, se assim o desejar, as leis da sociedade, a forma pela qual essas leis poderão ser executadas, o processo que utilizaremos para descobri-las. Mas, por Deus, depois que tivermos destruído a priori todos os dogmatismos, não sonhemos por nossa vez em doutrinar as pessoas; não nos deixemos cair na contradição de seu compatriota Martin Lutero que, depois de ter demolido a teologia católica, lançou-se imediatamente à tarefa de criar as bases de uma teologia protestante, utilizando-se da excomunhão e do anátema. Nestes últimos três séculos, uma das principais preocupações da Alemanha tem sido desfazer o mau trabalho de Lutero. Não deixemos pois à humanidade a tarefa de desfazer uma embrulhada semelhante como resultado de nossos esforços.
Aplaudo, de todo o coração, sua idéia de trazer todas as opiniões à luz. Iniciemos sim uma boa e leal polêmica; tentemos dar ao mundo um exemplo de tolerância sábia e perspicaz, mas não nos transformemos, pelo simples fato de que somos os líderes de um movimento, em líderes de uma nova forma de intolerância; não posemos de apóstolos de uma nova religião, mesmo que seja a religião da lógica e da razão.
Vamos reunir e estimular todas as formas de protestos, vamos rechaçar toda a aristocracia, todo o misticismo; jamais consideremos qualquer tema esgotado e, quando tivermos lançado mão do nosso último argumento, comecemos outra vez - se preciso for - a discussão, com eloqüência e ironia. Sob tais condições eu alegremente unir-me-ei a vós. De outra forma - não!
Também tenho algumas observações a fazer sobre esta frase da sua carta - o momento da ação. Talvez o senhor ainda mantenha a opinião que no momento é impossível haver qualquer reforma sem que haja um coup de main, sem o que era antes chamado revolução e que na verdade não é nada mais do que um choque. Esta segunda idéia que eu entendo, perdôo e que estaria disposto a discutir, tendo eu mesmo compartilhado dela durante um longo tempo, meus estudos mais recentes me fizeram abandoná-la totalmente. Não creio que tenhamos de lançar mão dela para triunfar e, conseqüentemente, não devemos colocar a ação revolucionária como um meio para alcançar a reforma social, já que esse pretenso meio seria apenas um apelo à força, à arbitrariedade, em resumo, uma contradição. Eu coloco assim o problema: provocar o retorno à sociedade, por meio de uma combinação econômica, da riqueza que ela perdeu graças a uma outra combinação. Em outras palavras, utilizar a Economia Política para transformar a teoria da Propriedade contra a Propriedade de forma a criar aquilo que os socialistas alemães - vocês - chamam de comunidade e que eu pessoalmente me limitarei, por ora, a chamar de liberdade ou igualdade. Creio possuir os meios para resolver este problema dentro de muito pouco tempo: preferiria, portanto, queimar a propriedade em fogo lento a lhe dar novo alento fazendo uma noite de São Bartolomeu com aqueles que a têm nas mãos.


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