A arte de reclamar
As pessoas reclamam. Os jovens reclamam, os mais velhos reclamam, os pobres reclamam, os milionários reclamam (provavelmente porque a Ferrari que encomendaram demorará alguns meses para chegar). Reclamar é normal. Quem nunca reclamou ao chegar no final de um domingo, ou que está muito calor? Para mim isso é até um comentário, não chega a ser uma reclamação.O meu desconforto é com os viciados em reclamar. Sim, reclamar vicia. Comece a reparar: há pessoas que não param de reclamar, e as reclamações vão atingindo tal banalidade que os viciados não conseguem estabelecer um diálogo sem que haja reclamações, reclamações e reclamações.Os viciados em reclamar reclamam de tudo. Está muito calor ou muito frio, o tempo está muito seco ou não pára de chover, tenho muito trabalho ou trabalho de menos. Só que não pára por aí. Ultimamente venho colecionando pérolas dessas pessoas (aqui no meu trabalho são muitos os viciados, e por coincidência são os piores funcionários, os que não saem do lugar). Uma das piores que ouvi recentemente era que o café estava muito quente !!! (provavelmente em um bar essa pessoa reclama que o chope veio muito gelado ...). E mais uma vez não pára por aí: tive insônia ou dormi demais, estou com fome ou comi muito, etc. Vício é assim mesmo.Há reclamações que estão na moda. Podem reparar. Hoje a moda é reclamar da queda da bolsa (embora os viciados na maioria das vezes nunca terão aplicações lá). Houve um tempo que a moda era reclamar de atrasos nos aeroportos. Desde que Santos Dumont inventou o avião é que existem atrasos, os controladores de vôo não podem prever nevascas e tempestades. Não estou falando aqui daqueles atrasos horrendos de dias, esses sim culpa do descalabro da aviação brasileira, mas dos básicos, já que como estava na moda, qualquer 15 minutos era considerado imperdoável. A imagem mais comum era de pessoas jogadas nos aeroportos (jogadas mesmo, nunca mostravam ninguém sentadinho lendo uma revista) com aquelas caras de enfado e arrogância, e sempre com um engraçadinho que erguia a voz quando havia alguma câmara de televisão ligada. Vá para a rodoviária !!!! E reclamar do aquecimento global então? Super fashion. A polícia não presta? Mais na moda impossível.Não estou defendendo as pessoas que não tem boca pra nada, ou pior, que tem “complexo de Polyana” e até em uma pisada no cocô do cachorro conseguem ver o lado bom das coisas. Longe disso. Para mim cheira a falsidade.As pessoas normais sabem reclamar. Se forem mal atendidas, vão falar com o gerente. Se adquirirem um produto do qual não ficaram satisfeitas, ligam para a central de atendimento. Se há um bueiro aberto ou um buraco na rua, acionam a prefeitura. Se a patroa não gostou do serviço da empregada, vai ter uma conversa e ensinar o certo. Se o relacionamento está ruim, terminam. Se estiverem com frio, pegam um casaco, e se estão com calor simplesmente tomam um banho. Mas dá trabalho reclamar direito, muitas vezes somos mal compreendidos. Na última vez que fui ao supermercado, reclamei porque havia uma pessoa com o carrinho cheio na fila do caixa rápido (rápido onde???) e tive que agüentar a cara feia da operadora de caixa. Da próxima vez reclamo com o gerente.Mas as pessoas viciadas não fazem nada, absolutamente nada, para melhorar sua situação. Mesmo porque, se reclamarem com a pessoa certa e seu problema for resolvido, terão que arranjar outro objeto de reclamação. Por isso é tão comum ver pessoas reclamando que estão acima do peso sentadas no sofá comendo chocolate, pessoas falando mal de seus companheiros e no entanto continuam casadas, ou pessoas que deixam para ir ao banco no horário de pico só para ficarem horas reclamando da demora da fila.Viciados, a boa notícia é que há cura para todos. Procurem observar o comportamento de pessoas que tem menos que vocês. Menos saúde, menos dinheiro, menos amor. E comecem a perceber que muitas vezes essas pessoas não reclamam, apenas aceitam as mazelas e procuram melhorar. Tentem ficar um dia inteirinho sem reclamar. É difícil. As pessoas ao seu redor agradecem. Como no AA, um dia de cada vez. (Juliana Altafin Galli)
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