João, o Discípulo Amado
Sabemos pelos Evangelhos que João era filho de Zebedeu e de Maria Salomé. Com seu irmão Tiago, auxiliava o pai na pesca no lago de Genezaré. Pelos Evangelhos, sabemos também que seu pai possuía alguns barcos e empregados que trabalhavam para ele. Maria Salomé é apontada como uma das santas mulheres que acompanhavam o Divino Mestre para O servir.Como seus outros dois irmãos, Simão e André, também pescadores, era discípulo de João Batista, o Precursor. Deste haviam recebido o batismo, zelosos que eram preparando-se para a vinda do Messias prometido.Certa vez, estavam João e André com o Precursor, quando passou Jesus a alguma distância. O Batista exclama: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo!". No dia seguinte, repetiu-se a mesma cena, e desta vez os dois discípulos seguiram a Jesus e permaneceram com Ele aquele dia (Jo, 1, 35 a 39).Algumas semanas depois estavam Simão e André lançando as redes às águas, quando passou Jesus e lhes disse: "Vinde após mim. Eu vos farei pescadores de homens...". Mais adiante estavam Tiago e João numa barca, consertando as redes. "E chamou-os logo. E eles deixaram na barca seu pai Zebedeu, com os empregados, e O seguiram". (Mc 1, 16 a 20).A partir de então, passaram a acompanhar o Messias em sua missão pública. Logo outros se juntaram a eles, que perfariam o número de doze, completando assim, o Colégio Apostólico.Preeminência de três Apóstolos sobre os demaisDesde logo, Pedro, Tiago e João tomaram preeminência sobre os outros Apóstolos, tornando-se os "escolhidos dentre os escolhidos". E, como tais, participaram de alguns dos mais notáveis episódios na vida do Salvador, como a ressurreição da filha de Jairo, a Transfiguração no Tabor e a Agonia no Horto das Oliveiras.João foi também um dos quatro que estavam presentes quando Jesus revelou os sinais da ruína de Jerusalém e do fim do mundo. Mais tarde, com Pedro, a quem o unia respeitosa e profunda amizade, foi encarregado de preparar a Última Ceia. Pedro amava ternamente João, e essa amizade é visível, tanto no Evangelho quanto nos Atos dos Apóstolos.Por sua pureza de vida, inocência e virgindade, João tornou-se logo o discípulo amado, e isso de um modo tão notório, que ele sempre se identificará em seu Evangelho como "o discípulo que Jesus amava". Apesar de os Apóstolos não estarem ainda confirmados na graça, isso não provocava neles inveja nem emulação. Quando queriam obter algo do Mestre Jesus, faziam-no por intermédio de João, pois seu bom gênio e bondade de espírito tornavam-no querido de todos.Mas esta serenidade, esta doçura, este caráter recolhido e amoroso de João Evangelista, são algo diferente da inércia e da passividade. Os pintores nos acostumaram a ver nele um não sei quê de feminino e sentimental, que está em contraste com a energia varonil e o zelo fulgurante que se descobre em algumas passagens evangélicas. Se Jesus amava particularmente a João, também era por ele amado de maneira especialíssima. Com seu irmão Tiago, recebeu de Cristo o cognome de "Boanerges", ou "filhos do trovão", por seu zelo. Indignaram-se contra os samaritanos, que não quiseram receber o Mestre, e pediram-Lhe para fazer descer sobre aqueles indóceis o fogo do céu.Foi por esse amor, e não por ambição, que ele e o irmão secundaram a mãe, Salomé, solicitando que um e outro ficassem à direita e à esquerda do Redentor, em seu Reino, embora de forma equivocada, pois imaginavam ainda um reino terreno. Quando Jesus perguntou-lhes se estavam dispostos a beber com Ele o mesmo cálice do sofrimento e da amargura, com determinação responderam afirmativamente.Entretanto, uma das maiores prova de afeição de Jesus a João deu-se na Última Ceia. Quis o Divino Mestre ter à sua direita o querido Apóstolo, permitindo-lhe a familiaridade de recostar-se em seu coração. Diz Agostinho que “nesse momento, estando tão próximo da fonte de Luz, ele absorveu dela os mais altos segredos e mistérios que depois derramaria sobre a Igreja.”João teve, porém, um momento de fraqueza — e das mais censuráveis — quando os inimigos prenderam Jesus, tendo então fugido como os outros Apóstolos. Era o momento em que Jesus mais precisava de apoio. Logo depois o vemos acompanhando, de longe, o Mestre ao palácio do Sumo Sacerdote. Como era ali conhecido, fez entrar também Simão Pedro. Pode-se supor que ele tenha permanecido sempre nas proximidades de seu “Senhor” durante toda aquela trágica noite, e que não saiu senão para ir comunicar a Maria o que se passava com seu Filho. Acompanhou-a, então no caminho do Calvário e com ela permaneceu ao pé da cruz. Era o sinal evidente de seu arrependimento.Foi ele também o único dos Apóstolos a presenciar e a sofrer o drama do Gólgota, servindo de apoio à Mãe das Dores, que com seu Filho compartilhava a terrível Paixão e morte na cruz.Quando, no Domingo da Ressurreição, Maria Madalena veio dizer aos Apóstolos que o túmulo estava vazio, foi ele o primeiro a correr, seguido de Pedro, para o local. E depois, estando no Mar de Tiberíades, aparecendo Jesus na margem, foi o primeiro a reconhecê-Lo.Nos Atos dos Apóstolos, ele aparece sempre com Pedro. Juntos estavam, quando, indo ao Templo junto à porta Formosa, para orar, um coxo pediu-lhes esmola. Pedro curou-o, e depois pregou ao povo que se reuniu por causa de tal maravilha. Juntos foram presos até o dia seguinte, quando corajosamente defenderam sua fé em Cristo diante dos fariseus. Mais adiante, quando o diácono Felipe havia convertido e batizado muitos na Samaria, era necessário que para lá fosse um dos Apóstolos a fim de os confortar e orientar. Novamente, foram escolhidos Pedro e João para a missão.Paulo, em sua terceira ida a Jerusalém, narra em sua Epístola aos Gálatas (2, 9) que lá encontrou "Tiago, Cleofas e João, que são considerados as colunas", e que eles, "reconhecendo a graça que me foi dada para pregar o Evangelho, deram as mãos a mim e a Barnabé, em sinal de pleno acordo.”Assim, teria ele permanecido com Ela em Jerusalém e depois em Éfeso. "Dois motivos principais deveriam ter ocasionado essa mudança de residência: de um lado, a vitalidade do cristianismo nessa nobre cidade; de outro, as perniciosas heresias que começavam a germinar. João queria assim empenhar sua autoridade apostólica, quer para preservar quer para coroar o glorioso edifício construído por São Paulo; e sua poderosa influência não contribuiu pouco para dar às igrejas da Ásia a surpreendente vitalidade que elas conservaram durante o segundo século. Ocorre, então, segundo a tradição, o martírio de João. O Imperador Domiciano o fez prender e levar a Roma. Na Cidade Eterna, ele foi flagelado e colocado num caldeirão de azeite fervendo. Mas o Apóstolo saiu dele rejuvenescido e sem sofrer dano algum. Domiciano, espantado com o grande milagre, não ousou atentar uma segunda vez contra ele, mas o desterrou para a ilha de Patmos, que era pouco mais do que um rochedo. Foi ali, que João escreveu o mais profético dos livros das Sagradas Escrituras, o Apocalipse.Após a morte de Domiciano, o Apóstolo voltou a Éfeso. E ali, segundo alguns Doutores da Igreja, para combater as doutrinas nascentes de Cerinto e de Ebion — que negavam a natureza divina de Cristo — escreveu ele seu Evangelho. Ordenou, antes, a todos os fiéis um jejum, que ele mesmo observou rigorosamente, para em seguida ditar a seu discípulo Prócoro, no alto de uma montanha, o monumento que é seu Evangelho. Transportado em Deus, com um vôo de águia, ele o começa de uma altura sublime: "No princípio era o Verbo, e o Verbo estava em Deus, e o Verbo era Deus".João escreveu também três Epístolas, sempre visando estabelecer a verdadeira doutrina contra erros incipientes que se infiltravam na Igreja.Segundo uma tradição, o discípulo que Jesus amava teria morrido em Éfeso, provavelmente em 27 de dezembro do ano 101 ou 102.Mas alguns exegetas levantam a hipótese de ele não ter falecido, com base na seguinte passagem do Evangelho: logo após a pesca milagrosa no lago de Tiberíades — depois da Ressurreição de Jesus — O Senhor confiou a Pedro uma importante missão. Este, voltando-se ao Mestre, perguntou-lhe, referindo-se João: "E este? Que será dele?" Respondeu-lhe Jesus: "Que te importa se eu quero que ele fique até que eu venha?" O próprio João comenta: "Correu por isso o boato entre os irmãos de que aquele discípulo não morreria. Mas Jesus não lhe disse `não morrerá', mas `que te importa se quero que ele fique assim até que eu venha?'" (Jo 21, 15 a 23).
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