terça-feira, 20 de agosto de 2013

Nilson: Crônica Policial 03 - Tiros na Noite

Tiros na noite


Madrugada de uma quarta-feira fria do mês de agosto. Um aviso feito por meio do sistema de comunicação interna da Polícia Militar informava que havia ocorrido um roubo de caminhão em uma cidade vizinha e que possivelmente os meliantes tentariam adentrar o território paraguaio.

Os ladrões seriam três homens fortemente armados, que haviam invadido a residência de um cidadão que trabalhava como distribuidor de salgadinhos empacotados e feito à família refém. Pai, mãe e dois filhos, ainda crianças, haviam sido levados para uma mata e lá amarrados. O homem conseguiu se soltar depois de algum tempo, libertou a família e avisou a PM.

Os policiais mundonovenses, apesar da desvantagem numérica, pois apenas dois militares, um cabo e um soldado, compunham a guarnição, se deslocaram para a região conhecida como “Pé-de-Galinha”, que fica na Estrada do Cachimbo, próximo à Igrejinha.

Devido ao percurso do tempo, os militares ainda posicionavam a viatura, quando o caminhão conduzido por um dos meliantes, acompanhado pelos comparsas que faziam a “segurança”, se aproximou. Antes mesmo que os policiais pudessem reagir, os bandidos atiraram. Diversos disparos feitos de pistolas nove milímetros, um dos calibres mais letais que existe, são efetuados em direção aos agentes da lei.

O Cabo é alvejado, recebeu um projétil em uma de suas pernas, suficiente para explodir músculos e nervos, além de comprometer o sistema de irrigação sangüínea do membro. Ele cai e para resguardar a própria vida, rasteja para baixo da viatura. A dor é lancinante, insuportável. Talvez se morresse, não doeria tanto, porém a vontade de viver é maior do que a dor. A força da alma domina o corpo.

 Um filme passa por sua cabeça. A vida simples na roça, convivência em família, curso de formação da PM, o trabalho rotineiro na Polícia, quando possível e a eslaca de serviço permite, idas dominicais idas a igreja e excursões à basílica de Aparecida. Quantas lembranças, os filhos. “Ai Meu Deus e se eu  morrer, como eles ficarão”? 

O soldado escuta os gritos do companheiro de batalha e tentado a socorrê-lo, ainda se vê obrigado a efetuar tiros nos bandidos, pois caso não fizesse isso, também poderia ser baleado. Acerta o veículo com tiros de fuzil 762. O motorista perde o controle do caminhão e acaba  colidindo contra o barranco. 

Um silêncio ensurdecedor. Neste momento, a escuridão de uma noite sem lua, se agiganta. O soldado consegue pedir apoio no sistema de rádio da polícia. Coloca o amigo baleado na viatura e segue com destino à cidade. Inicia-se uma nova batalha. Desta vez é literalmente uma luta de vida ou morte. O tempo é inimigo, pois o sangramento no irmão de farda é intenso.

Encaminhado ao hospital de plantão, o policial tem seu quadro agravado. Os recursos médicos são escassos. O profissional de saúde que o atendeu recomenda a transferência para um centro maior, a cidade de Dourados, distante 250 quilômetros. Mais uma preocupação, Mundo Novo não possui UTI móvel. 

Mas, apesar do grave ferimento e do corpo franzino, o militar é guerreiro. Briga contra a morte, esta determinada a sobreviver. O soldado seu amigo, retorna ao matagal para auxiliar os demais policiais na busca pelos bandidos. Um outro soldado, também companheiro de batalhas, embarca na ambulância, vai sentado ao seu lado na maca, dando lhe apoio físico e espiritual. Sob as bênçãos do Comandante Supremo do Universo, ele chega vivo ao hospital.

Nilson Silva 



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